terça-feira, 30 de junho de 2009


Agridoce.
Azedo.
Cítrico.
Salgado.
Venenoso. Sempre.
Para o paladar dela, o gosto era sempre diferente. Os de sua espécie sempre consideravam a mesma coisa, mas para ela havia sempre um sabor à mais.
Medo.
Terror.
Luxúria.
Desejo.
Gostoso. Sempre.
O sentimento do outro também influenciava no sabor que ela sentiria.
Deixou que o corpo mole, já sem vida, deslizasse entre seus braços e caísse ao chão, bem ali, no meio do beco escuro. Escuro. Morte era escura. Dor era escura. O escuro representava a chegada dela. Do monstro que se alimentava de outros. Da sugadora de sangue. Da besta suja que tomava para si a vida dos outros.
Ela sorriu. No escuro daquele beco era tudo o que poderiam ver. Os dentes longos e brancos e os olhos vermelhos escalartes. Ela sorriu e deixou aquele corpo inerte caído entre as poças de água suja.
E saiu do beco. Passou a língua no canto da boca, onde o sangue quente ainda escorria. Ajeitou o cabelo e fechou o sobretudo que escondia o belo corpo, o qual ela usava como arma de conquista. Arma para atrair comida. Caminhou pela rua. Os homens a olhava com desejo, e ela sorria de volta... Em busca da próxima presa que teria sua vida extraída por ela.

terça-feira, 23 de junho de 2009


Lentamente. Vagarosamente. Hesitantemente.
Os olhos deça fixos nos dele. Ele podia ver o próprio reflexo. Ela também.
Por alguns segundos eles se olharam como se estivessem vendo a alma do outro. Compatibilidade. Se existisse mesmo a aclamada alma-gêmea, definitivamente ali estavam as duas metades da laranja.
Conversaram com os olhos. Uma linguagem única. Só deles. Como um código secreto guardado à sete chaves na caixa de pandora de seus corações. Uma empatia mútua que parecia criar uma aurea brilhante e quente, que tinha a forma de fitas de cetim que entrelaçavam-se entre eles formando um laço indestrutível.
Como se as fitas invisíveis estivessem apertando-se, eles se aproximaram. A mão esquerda dele tocou o lado direito da face dela. Ela sentiu arrepiar-se. A mão direita dele a abraçou pela cintura criando o primeiro contato entre os corpos. Vagarosamente ele aproximou o rosto do dela.
O hálito adocicado dele fizeram as pernas dela tremerem. O cheiro suave da pele dela fizeram as mãos dele vacilarem reagindo à tontura que ele tivera.
Como se agissem combinadamente, eles fecharam os olhos. E os lábios dele pousaram sobre os dela.

~~*~~

Uma onda de prazer indescritível percorreu o corpo dela. Instantaneamente ela jogou os braços sobre o pescoço dele puxando-o mais para si. O beijo intensificou-se. Como um veneno mortal que lhe entorpecia os sentidos, a saliva doce dele era tomada com ansiedade por ela. Inundando o interior da garota como se pretendesse a dominar, ela sentiu o gosto dos lábios dele por todo o corpo. Como se fosse o próprio sangue que corria-lhe pelas veias. Como se fosse o próprio ar que enchia-lhe os pulmões.
E ela o desejou para si como nunca fizera antes. O desejou por inteiro. Tomá-lo sem pudor. Monopolizá-lo. Tornar os dois em um só. E ela puxou ainda mais a cabeça dele, segurando-o pelos cabelos com o intuito de mantê-lo ali para sempre.

~~*~~

Os pelos do corpo dele eriçaram-se. Os lábios friccionaram-se ainda mais sobre os dela. Ele a puxou pela cintura em um abraço quase sufocante.
O gosto dos lábios dela era como uma chuva que lavava sua alma.
O sabor inebriante que ele buscou durante muito tempo... Estava ali.
Vindo de outrora. Outras vidas. Outros ele. Outros ela.
Era destino.

quarta-feira, 3 de junho de 2009


Os olhos negros fitam a chuva lá fora.
Aquele olhar firme da menina atravessa a camada de vidro da janela do seu quarto. A janela amiga. Sua única ligação com o mundo lá fora naquele momento.
Ela pode ver os pneus deslizando pelo asfalto e fazendo a água jorrar por sobre as calçadas. Ela pode ver pessoas que vão e vem. Umas correm da chuva, outras protegem-se através do fino tecido de um guarda-chuva, e é sempre assim quando está chovendo.
Tédio. As ruas ficam vazias, os apartamentos cheios. Pessoas dorme aquecidas em suas camas, outras dormem enroladas em papelão embaixo de alguma ponte. Alguns ficam vendo outra realidade em alguma obra cinematográfica enquanto tomam um chocolate quente, outras ficam vendo a dura realidade de sua vida tentando se abrigar em alguma puxada de uma loja enquanto passam fome.
Tanta coisa pra temer, e as pessoas temem a chuva. Tolos.
O vidro da janelafica embaçado e vagarosamente ela desliza a mão sobre ele para tornar a imagem nítida novamente. Um rosto surge em meio a chuva. Um rosto sorridente.
Um garoto. Deve ter mais ou menos a mesma idade que ela. Ele brinca. E dança e canta e pula na chuva.
Ele tem cabelos claros, molhados. Uma camiseta que seria branca se não fosse pela sujeira impregnada nela e um shorts vermelho. Ele está descalço. Ela acha intrigante, ele não corre da chhva.
Ele joga as mãos para o céu e deixa a cuva banhá-lo; Gira, gira, gira e pula. E repete tudo outra vez. E ela ri, acha graça e ri.
Ele para e olha na direção dela. Os olhos dos dois se encontram, ela observa os olhos cor de mel dele. Um minuto. Parecia que o mundo tinha parado. Ele sorri. Ela também.
E ele segue seu caminho ainda dançando na chuva. Ele se foi com o vento, igualmente como viera.
Ele se foi. A chuva se foi. O dia se foi.
Agora ela espera que chova de novo, pra que ela possa sentar-se à janela e aguardar que ele dance na chuva pra ela novamente.
Ela espera rever os olhos cor de mel do vagabundo que sem querer roubou o coração daquela dama. Ela vai esperar pacientemente para rever seu primeiro amor e quem sabe dessa vez dançar na chuva ao lado dele.